Contributo endereçado à revisão do PENT no horizonte de 2015, no âmbito da consulta pública em curso. Aqui.
Sendo certo o consenso sobre a diversidade concentrada na proposta de valores essenciais e ativação da marca «Destino Portugal», não se percebe que todos os indicadores e propostas sejam divididos numa lógica regional. Nesta metodologia de trabalho conseguimos parâmetros de aferição vários sobre os que vêm e para onde vêm, mas não percebemos ao que vêm. Julgamos que será este o calcanhar de Aquiles desta proposta que falha na clarificação da oferta nacional centrada no produto.
Naturalmente que no produto estadias de curta duração em cidade a abordagem que defendemos não fará muito sentido, já nos produtos gastronomia e vinhos, ou no surf, facilmente se percebe que a diversidade é fundamental para qualificar a oferta e contribuir para a duração da estadia. Mesmo no sol e mar também a possibilidade de juntar à tranquilidade do mediterrâneo a magnitude do atlântico nos parece a via mais sustentável para a valorização de uma oferta que dificilmente conseguirá contrariar a preferência dos países da bacia do Mediterrâneo, como a Turquia (líder neste ranking), em detrimento dos destinos tradicionais como Portugal. Por muito apetecível que seja este produto parece-nos difícil a competição entre um país claramente mediterrânico com um país sobretudo atlântico, quando os factores de competitividade não aprofundam os nossos valores distintivos.
É no entanto ao atlântico que a revisão do PENT vai buscar a primeira novidade: inscrição do segmento surfing no produto turismo náutico. Uma evolução muito positiva ainda que este avanço possa não ser suficiente para a afirmação deste segmento emergente. Apesar do mérito que reconhecemos com esta entrada, encontramos falhas graves na constituição do produto, na identificação dos factores de competitividade e ainda na estruturação da oferta. Acreditamos que estas só não vão condicionar o bom desempenho no sector porque aqui a qualidade do recurso continuará a servir a oferta, resistindo mesmo ao pior desempenho da administração central, como se tem verificado até ao presente.
Sobre a constituição do produto, para além da substituição da designação de surfing por surf, por uma questão básica de credibilidade, há que separar definitivamente as águas: náutica de recreio e surf são produtos completamente distintos. A ligação à gastronomia e vinhos de cada um destes produtos será certamente mais forte do que as afinidades entre si. A falha nesta associação denota desde logo a necessidade urgente de aprofundamento sobre as realidades em causa, sob pena de se vir a prestar um mau serviço a ambas. A relação do surf com o mar é directa, a partir da praia como na arte-xávega, a da náutica de recreio é indirecta, a partir de um ancoradouro protegido como nos transportes marítimos. Os primeiros procuram a rebentação os outros fogem dela.
Na identificação dos factores de competitividade a primeira falha é a ausência de qualquer referência aos mais de 800Km de costa no continente e de quase uma dúzia de ilhas capazes de garantir condições de surf em 365 dias por ano. A segunda é a falha resultante da persistência no erro fundado numa procura generalista, que orienta o produto para os destinos consolidados, ignorando o juízo da comunidade do surf. Não nos oferece qualquer dúvida quanto à inscrição da Ericeira, Peniche ou a Nazaré nos destinos que deverão puxar pelo todo nacional, mas não podemos esconder a nossa perplexidade com a ausência da onda (direita) mais comprida do continente europeu (talvez a mais comprida do mundo, destacada num recente artigo da prestigiada revista The Surfer's Journal), na baía de Buarcos, na Figueira da Foz. Tratando-se de um produto que se baseia num activo cujo impacto da procura pode resultar numa não desejada saturação, eventualmente comprometendo a qualidade da oferta, não fará qualquer sentido excluir qualquer onda de reconhecida qualidade internacional no grupo de destaque, nem negligenciar o valor do conjunto da nossa costa.
A estruturação da oferta por regiões, no produto surf, é contraproducente com o objectivo da sua afirmação no mercado global. Quem procura o surf no nosso país, não procura a região mas sim a A8 até à Figueira da Foz - a autoestrada dos surfistas como lhe chamou Virgílio Azevedo em "O país que vai na onda", na Revista Única, em 2/12/2011. No surf, como no montanhismo, o que se procura sempre é coleccionar picos, subir aos mais altos dos cinco continentes e não subir cinco vezes o mesmo, ainda que seja o Everest. O país que o Financial Times reconhece como destino de surf na Europa, que tem em 150km de costa a primeira reserva mundial de surf e a segunda prova do WCT, assim como ondas entre as maiores e as mais longas em todo o globo, pode e deve erguer a bandeira da diversidade concentrada, evitando também a competição das regiões pelo surf que só pode resultar em prejuízo para o produto e para o recurso que sustenta a oferta, as ondas.
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