[...] No passado descurámos completamente as questões de ordenamento. Construímos em zonas dinâmicas e de risco, expusemos novas edificações a riscos que já seriam expectáveis. Por outro lado, a nível portuário – e os portos são vitais em termos económicos para o País –, tivemos sempre uma visão não integrada das infraestruturas. Foram aumentados e construídos quebra-mares, e aprofundados canais de navegação, sempre na perspetiva da melhoria das condições de segurança e de operacionalidade dos portos, mas ignorando, esquecendo ou fechando os olhos àquilo que seriam as consequências dessas infraestruturas a sotamar [...] Essa é uma das principais causas, pois as situações mais críticas estão quase sempre a sul dos portos que têm grandes quebramares e grandes canais de navegação [...] Existiram intervenções recentes em portos em que se dizia que os impactos a sotamar seriam apenas durante um, dois ou três anos e depois seria retomado um equilíbrio dinâmico natural.
Se isso não tinha acontecido em relação a intervenções feitas há 15 ou 20 anos, por que é que agora, numa intervenção ainda mais impactante, deixaria de ter impactos negativos ao fim de dois ou três anos?
Alertei sistematicamente para essas situações e isso foi sistematicamente ignorado [...] Num passado recente, diria até aos anos oitenta, a gestão da zona costeira estava entregue à Direção-geral de Portos, e a sua principal competência tinha a ver com os portos ao longo da costa portuguesa. Estudos e planos muito interessantes que foram realizados nessa altura, do ponto de vista do diagnóstico dos problemas de erosão, ainda hoje são relevantes, mas quanto às propostas de intervenção ignoravam-se completamente as questões de ordenamento do território e as soluções passavam por construir esporões de norte a sul do País [...] E sempre que se diz que o problema está “definitivamente resolvido”, passados alguns anos, afinal, ou porque o mar colocou areias no canal ou porque o porto precisa de ser expandido, ou porque é preciso aumentar as condições de navegabilidade e acesso às embarcações, aumentam-se os quebramares e aprofundam-se canais, como ocorreu recentemente. As consequências na instabilidade a sul da barra são mais visíveis e têm mais impacto nos últimos 40 ou 50 anos. E desde há mais de 30 que andamos a dizer que os problemas a sul de Aveiro estão a agravar-se e vão continuar a agravar-se [...] Foi um erro não se terem assumido e mitigado os impactos negativos a sul de Aveiro. Nem todos os investigadores e técnicos tiveram coragem para denunciar a situação. Fi-lo muitas vezes, e ao longo de muitos anos, em relação à costa a sul de Aveiro e a sul da Figueira da Foz [...]
[...] Os esporões não funcionam se não houver trânsito de areias, as fundações dos paredões começam a ser infraescavadas porque não estão assentes em rocha e entram em processo de instabilidade [...]
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